Depois de navegar mais de 400 milhas náuticas (mn) por 9 semanas na ICW - Intracoastal Waterway, na Costa Leste (Atlântica) da Florida, vou analisar alguns tópicos que podem interessar aos leitores. Nossa navegação foi realizada no catamaran TinguaCat, um Lagoon380S2 2007 com calado de 1,15 m (3' 9") e clearance - altura livre da linha d' água até o tope do mastro - de 17,32 m (56' 10").
Navegação
A ICW é uma via navegável interna ao longo da costa Atlântica e do Golfo do México nos Estados Unidos, composta por rios internos de água salgada, lagoons e sounds, canais artificiais, inlets (barras) e até eclusas. Oficialmente ela abrange cerca de 4.000 statute miles (stm) entre Cape Ann, ao Norte de Boston, em Massachusetts, e Brownsville, no Texas, junto a fronteira do México. O segmento mais usado é o de 1098 stm entre a Hospital Point, em Norfolk no estado de Virginia, e a Biscayne Bay, em Miami. Na Florida não encontrei tráfico de mercadorias, que já foi significativo nos primórdios desta via.
Aqui uma primeira dica. Na ICW no lugar da milha náutica (mn) usa-se a statute mile (stm), que é a mesma rodoviária e vale 1609,344 m (ou 5280 pés ou 1760 jardas). Não sendo totalmente preciso, podemos dizer que 1 stm x 0.87 é igual a 1 mn e 1 mn é igual a 1 stm x 1,15. Portanto, a cada 7 mn temos 8 stm.
Há duas restrições ao se navegar na ICW: o calado e o clearance. O canal navegável é para ter no mínimo 12' (pés ou 3,66 m) de profundidade no seu centro, mas há cerca de 18 pontos difíceis de manter, notadamente próximo a barras. Eu encontrei em várias ocasiões profundidades menores, sempre com 8' (2,44 m) ou mais. O problema da altura é com relação as pontes. A altura mínima das pontes fixas é 65' (19,81 m), mas há duas exceções. Uma com 64' na Carolina do Norte e a Turtle Bridge, na altura da stm 1087,1, próxima a Miami com 56'. Todas as demais pontes são de abrir (drawbridge). Abrem solicitando ao operador pelo canal 9 do VHF, mas algumas só abrem em horários determinados, em geral de meia em meia hora. Há algumas ainda que não abrem nos períodos de pico do transito na manhã e no final da tarde.
Então a ICW permite a navegação de qualquer tipo de embarcação que atenda aquelas restrições. Há relatos de iates com mais de 200' navegando nela. No entanto, veleiros (28 a 45') e trawlers (32 a 50') médios, com calado até 8' não terão nenhum problema. Ela também é muito bem sinalizada e constantemente mantida, mesmo que nos últimos anos a entidade responsável não tenha tido toda a verba necessária. Outra dica, quando se ruma ao Sul é como entrar no porto (verde-vermelho) e no rumo Norte é como sair do porto (verde-verde).
É uma navegação que exige muita atenção. Há trechos onde se sair do canal é encalhe na certa, bem como trechos estreitos e sinuosos. Isto dificulta velejar e utilizar piloto automático. Mas, na maioria do segmento da Florida as águas são mais amplas, e com profundidades melhores.
Cartas Náuticas e Guias
Tinha as cartas físicas da parte da Florida mas efetivamente não usei. Utilizei cartas digitais Navionics no chartplotter Raymarine E80 e no iPad, estas com a última atualização e opção de utilizar as cartas originais NOAA. Como backup tinha um GPSmap Garmin 78sc com cartas BlueChart. Recomendo usar um guia que te dê todas as dicas de navegação, ancoragens, marinas, pontos de interesse, etc. Eu utilizei o CruiseGuide for Intracoastal Waterway, de Mark e Diana Doyle. Muito completo e com 99% de acerto. Gosto muito neste guia da seção mile-by-mile, excelente durante a navegação.
Clima
Os ventos predominantes são de Sul a Leste com um pouco de Nordeste, mas no inverno tem seguidas frentes frias com ventos gelados de Norte e Noroeste. Não é raro ventos de força 5 e 6 (17 a 27 nós), que as vezes "roncam" a noite toda. No inverno chove pouco e pode-se pegar temperaturas abaixo de 10º C. Não tem mar, apenas marolas, e marés e correntes, principalmente próximo aos inlets com o Oceano Atlântico. Por falar em marolas, as lanchas e iates em sua maioria diminuem a velocidade ao cruzarem com os veleiros ou barcos menores.
Ancoragens
É bom programar a singradura a ser feita pois em alguns trechos há poucas opções de ancoragens, fora as marinas. Outra consideração são as correntes de maré que, dependendo do local, podem exigir o uso de ancoras na proa e popa. O guia lista todos os locais possíveis de uma boa ancoragem com todas as informações (corrente, profundidade, marés, proximidades, proteção). O fundo em geral é de boa tensa.
Marinas e Estaleiros
Falando em ancoragens, há muitas opções de marinas. No entanto, as mais interessantes são as marinas municipais que quase todas as cidades a margem da ICW possuem. São marinas simples, protegidas, com a infra-estrutura necessária: combustivel, água e pump-out sem taxa extra, energia elétrica no cais, banheiros, coin laundry, pier para dingues, sala de conveniência com bibliotecas tipo take one leave one, wifi, quiosques com churrasqueiras, coleta de lixo, algumas com poitas e loja de conveniência. Umas menores outras com mais de 300 vagas. Sempre eficientes, limpas e bem administradas. Além de serem as de melhor preço elas reunem a tribo dos cruzeiristas. Uma parada especial é a Vero Beach City Marina. Um dos principais points dos cruzeiristas é simples mas charmosa, numa localização especial, pequena no numero de slips, mas com um extenso mooring field onde na alta temporada os barcos amadrinham nas poitas pela falta de vaga.
Falando em cruzeiristas, a maioria são casais de idosos americanos ou canadenses. Mas há casais jovens, com filhos e, como não poderia deixar de ser, franceses. Os barcos costumam ser bem cuidados e equipados, mesmo os de muita idade. Os catamarans (na faixa de 32 a 40´) e trawlers são bem numerosos.
O custo das marinas fora da região Miami-Fort Lauderdale-Palm Beach é bem razoável para docagens mais longas, com preços entre 10 e 16 dolares por pé. Caro é a diária (transiente dockage) na faixa de 1,50 a 2 dolares por pé. Caro também é a eletricidade, que em geral não é medida e sim cobrada por taxa, provavelmente baseada no consumo das lanchas. Outro fato interessante é que, em geral, catamarans pagam por pé como qualquer monocasco.
Existem também vários boatyards que são estaleiros para todo tipo de serviço e não marinas, mesmo que em geral possuam algumas vagas molhadas e docagem no seco.
Pump-out
É o serviço de esvaziamento dos tanques de águas negras (ou holding tanks), obrigatórios. As leis ambientais americanas punem severamente o esgotamento nas águas internas ou próximas a costa dos vasos sanitários ou qualquer outro tipo de lixo, óleos, etc.. Em compensação, existe muita facilidade para se esgotar os tanques (o pump-out). Todas marinas tem, grátis para quem esta na marina e por taxas de menos de $10 dolares para não inquilinos. Algumas cidades possuem um serviço público que vem até seu barco por solicitação, também por uma pequena taxa.
Abastecimento
É bastante fácil ao longo da waterway. Muitas das ancoragens ficam próximas a parques na beira da via com pier para dingues e alguns até com pier municipal onde se pode atracar gratuitamente no período diurno.
Pela nossa experiência os melhores preços são nas redes BJ´s e Walmart. O BJ´s vende em quantidades maiores (estilo Makro) e é preciso ser associado ao custo de $40 anuais. Se for fazer uma compra grande vale a pena. Conhecemos também uma rede de mercados menores, que eles chamam de disccount grocery, com preços bem interessantes chamada Save a Lot. O melhor mercado é a rede Publix, que tem preços sempre alguns centavos mais caros que o Walmart. Mas para alimentos frescos e perecíveis vale a pena pagar. Como pão, por exemplo. O Publix tem baguettes razoáveis. Boas mesmo encontramos em dois cafés franceses, próximos a ancoragem, um no Lake Worth e outro em St. Augustine.
Transporte Público
Por falar em abastecimento, os lugares nem sempre são próximos e carro é fundamental nos EUA. No entanto, todas estas cidades tem algum tipo de transporte público que mesmo não tendo tantas frequências são eficientes e até de graça, como em Vero Beach, e não tem superlotação. Nos pagos tenha sempre o valor certo da tarifa pois eles não dão troco. Usamos em Vero Beach, Cocoa, Daytona Beach e St. Augustine. Uma bicicleta a bordo também é bem útil.
Internet
Assim como o GPS nos dias atuais cruzeiristas não vivem sem internet. E este é um problema para o qual não consegui uma boa solução. Fora das marinas só mesmo pelo celular, mas fica muito caro ainda mais se você tiver dois adolescentes a bordo. Em Port Salerno, existe um provedor com planos semanais e mensais a um bom custo que se propôs a atender toda a waterway, mas até agora só conseguiu nesta região e na de Key West.
Tínhamos instalado uma antena BadBoy (veja aqui), da canadense Bitstorm, que tem um longo alcance e cria uma rede interna. Ajuda muito a melhorar o sinal na poita e por duas ou três ocasiões conseguimos pegar redes abertas na ancoragem.
Turismo
Há muitas opções de turismo ao longo da ICW. São centros históricos, museus, parques diversos, centro espacial, praias, fortes, faróis, o Daytona Speedway, além de que a própria waterway tem paisagens maravilhosas. Para quem gosta, tem trechos com as margens cheias de mansões espetaculares, com "brinquedinhos" a altura. A campeã no item turismo é St. Augustine (veja aqui), a cidade mais velha dos EUA, com muitas atrações da época do domínio espanhol e inglês. Além de ser um bom centro náutico com muitas marinas e estaleiros e saída para o Atlântico.
Há duas restrições ao se navegar na ICW: o calado e o clearance. O canal navegável é para ter no mínimo 12' (pés ou 3,66 m) de profundidade no seu centro, mas há cerca de 18 pontos difíceis de manter, notadamente próximo a barras. Eu encontrei em várias ocasiões profundidades menores, sempre com 8' (2,44 m) ou mais. O problema da altura é com relação as pontes. A altura mínima das pontes fixas é 65' (19,81 m), mas há duas exceções. Uma com 64' na Carolina do Norte e a Turtle Bridge, na altura da stm 1087,1, próxima a Miami com 56'. Todas as demais pontes são de abrir (drawbridge). Abrem solicitando ao operador pelo canal 9 do VHF, mas algumas só abrem em horários determinados, em geral de meia em meia hora. Há algumas ainda que não abrem nos períodos de pico do transito na manhã e no final da tarde.
Todas as pontes fixas tem a marcação do clearence
Ponte basculante em Júpiter
Então a ICW permite a navegação de qualquer tipo de embarcação que atenda aquelas restrições. Há relatos de iates com mais de 200' navegando nela. No entanto, veleiros (28 a 45') e trawlers (32 a 50') médios, com calado até 8' não terão nenhum problema. Ela também é muito bem sinalizada e constantemente mantida, mesmo que nos últimos anos a entidade responsável não tenha tido toda a verba necessária. Outra dica, quando se ruma ao Sul é como entrar no porto (verde-vermelho) e no rumo Norte é como sair do porto (verde-verde).
Um iate na ICW
A sinalização dos limites do canal sempre presentes
É uma navegação que exige muita atenção. Há trechos onde se sair do canal é encalhe na certa, bem como trechos estreitos e sinuosos. Isto dificulta velejar e utilizar piloto automático. Mas, na maioria do segmento da Florida as águas são mais amplas, e com profundidades melhores.
Cartas Náuticas e Guias
Tinha as cartas físicas da parte da Florida mas efetivamente não usei. Utilizei cartas digitais Navionics no chartplotter Raymarine E80 e no iPad, estas com a última atualização e opção de utilizar as cartas originais NOAA. Como backup tinha um GPSmap Garmin 78sc com cartas BlueChart. Recomendo usar um guia que te dê todas as dicas de navegação, ancoragens, marinas, pontos de interesse, etc. Eu utilizei o CruiseGuide for Intracoastal Waterway, de Mark e Diana Doyle. Muito completo e com 99% de acerto. Gosto muito neste guia da seção mile-by-mile, excelente durante a navegação.
Detalhe da seção mile-by-mile do guia
Clima
Os ventos predominantes são de Sul a Leste com um pouco de Nordeste, mas no inverno tem seguidas frentes frias com ventos gelados de Norte e Noroeste. Não é raro ventos de força 5 e 6 (17 a 27 nós), que as vezes "roncam" a noite toda. No inverno chove pouco e pode-se pegar temperaturas abaixo de 10º C. Não tem mar, apenas marolas, e marés e correntes, principalmente próximo aos inlets com o Oceano Atlântico. Por falar em marolas, as lanchas e iates em sua maioria diminuem a velocidade ao cruzarem com os veleiros ou barcos menores.
Ancoragens
É bom programar a singradura a ser feita pois em alguns trechos há poucas opções de ancoragens, fora as marinas. Outra consideração são as correntes de maré que, dependendo do local, podem exigir o uso de ancoras na proa e popa. O guia lista todos os locais possíveis de uma boa ancoragem com todas as informações (corrente, profundidade, marés, proximidades, proteção). O fundo em geral é de boa tensa.
Marinas e Estaleiros
Falando em ancoragens, há muitas opções de marinas. No entanto, as mais interessantes são as marinas municipais que quase todas as cidades a margem da ICW possuem. São marinas simples, protegidas, com a infra-estrutura necessária: combustivel, água e pump-out sem taxa extra, energia elétrica no cais, banheiros, coin laundry, pier para dingues, sala de conveniência com bibliotecas tipo take one leave one, wifi, quiosques com churrasqueiras, coleta de lixo, algumas com poitas e loja de conveniência. Umas menores outras com mais de 300 vagas. Sempre eficientes, limpas e bem administradas. Além de serem as de melhor preço elas reunem a tribo dos cruzeiristas. Uma parada especial é a Vero Beach City Marina. Um dos principais points dos cruzeiristas é simples mas charmosa, numa localização especial, pequena no numero de slips, mas com um extenso mooring field onde na alta temporada os barcos amadrinham nas poitas pela falta de vaga.
O extenso mooring field da Vero Beach City Marina lotado
Falando em cruzeiristas, a maioria são casais de idosos americanos ou canadenses. Mas há casais jovens, com filhos e, como não poderia deixar de ser, franceses. Os barcos costumam ser bem cuidados e equipados, mesmo os de muita idade. Os catamarans (na faixa de 32 a 40´) e trawlers são bem numerosos.
Um proa dupla
O custo das marinas fora da região Miami-Fort Lauderdale-Palm Beach é bem razoável para docagens mais longas, com preços entre 10 e 16 dolares por pé. Caro é a diária (transiente dockage) na faixa de 1,50 a 2 dolares por pé. Caro também é a eletricidade, que em geral não é medida e sim cobrada por taxa, provavelmente baseada no consumo das lanchas. Outro fato interessante é que, em geral, catamarans pagam por pé como qualquer monocasco.
Existem também vários boatyards que são estaleiros para todo tipo de serviço e não marinas, mesmo que em geral possuam algumas vagas molhadas e docagem no seco.
Pump-out
É o serviço de esvaziamento dos tanques de águas negras (ou holding tanks), obrigatórios. As leis ambientais americanas punem severamente o esgotamento nas águas internas ou próximas a costa dos vasos sanitários ou qualquer outro tipo de lixo, óleos, etc.. Em compensação, existe muita facilidade para se esgotar os tanques (o pump-out). Todas marinas tem, grátis para quem esta na marina e por taxas de menos de $10 dolares para não inquilinos. Algumas cidades possuem um serviço público que vem até seu barco por solicitação, também por uma pequena taxa.
Abastecimento
É bastante fácil ao longo da waterway. Muitas das ancoragens ficam próximas a parques na beira da via com pier para dingues e alguns até com pier municipal onde se pode atracar gratuitamente no período diurno.
Pela nossa experiência os melhores preços são nas redes BJ´s e Walmart. O BJ´s vende em quantidades maiores (estilo Makro) e é preciso ser associado ao custo de $40 anuais. Se for fazer uma compra grande vale a pena. Conhecemos também uma rede de mercados menores, que eles chamam de disccount grocery, com preços bem interessantes chamada Save a Lot. O melhor mercado é a rede Publix, que tem preços sempre alguns centavos mais caros que o Walmart. Mas para alimentos frescos e perecíveis vale a pena pagar. Como pão, por exemplo. O Publix tem baguettes razoáveis. Boas mesmo encontramos em dois cafés franceses, próximos a ancoragem, um no Lake Worth e outro em St. Augustine.
Transporte Público
Por falar em abastecimento, os lugares nem sempre são próximos e carro é fundamental nos EUA. No entanto, todas estas cidades tem algum tipo de transporte público que mesmo não tendo tantas frequências são eficientes e até de graça, como em Vero Beach, e não tem superlotação. Nos pagos tenha sempre o valor certo da tarifa pois eles não dão troco. Usamos em Vero Beach, Cocoa, Daytona Beach e St. Augustine. Uma bicicleta a bordo também é bem útil.
Carro da GoLine o transporte público gratuito de Vero Beach
Internet
Assim como o GPS nos dias atuais cruzeiristas não vivem sem internet. E este é um problema para o qual não consegui uma boa solução. Fora das marinas só mesmo pelo celular, mas fica muito caro ainda mais se você tiver dois adolescentes a bordo. Em Port Salerno, existe um provedor com planos semanais e mensais a um bom custo que se propôs a atender toda a waterway, mas até agora só conseguiu nesta região e na de Key West.
Tínhamos instalado uma antena BadBoy (veja aqui), da canadense Bitstorm, que tem um longo alcance e cria uma rede interna. Ajuda muito a melhorar o sinal na poita e por duas ou três ocasiões conseguimos pegar redes abertas na ancoragem.
Turismo
Há muitas opções de turismo ao longo da ICW. São centros históricos, museus, parques diversos, centro espacial, praias, fortes, faróis, o Daytona Speedway, além de que a própria waterway tem paisagens maravilhosas. Para quem gosta, tem trechos com as margens cheias de mansões espetaculares, com "brinquedinhos" a altura. A campeã no item turismo é St. Augustine (veja aqui), a cidade mais velha dos EUA, com muitas atrações da época do domínio espanhol e inglês. Além de ser um bom centro náutico com muitas marinas e estaleiros e saída para o Atlântico.
Daytona Internacional Speedway